Faz o que tiver afim de fazer
Fazer exercício depois dos 30; A sapatilha que mudou o mundo; e o que cargas d´água Luisa Sonza tem a ver com Clarice Lispector
Olímpiadas quase acabando, clima esportivo no ar, galera torcendo pelas medalhas, descobrindo novas modalidades e, de repente, surge aquela vontade irresistível de fazer um esporte que você nunca nem tinha ouvido falar na vida, mas agora virou uma paixão súbita e irracional. Sim, chega o momento de buscar o time de badminton da cidade, o grupo de esgrima ou a galera da canoagem.
Olha, quem seria eu pra reprimir um desejo como esse. Logo eu, a rata de aulas experimentais, a própria ‘vamo vamo’ de qualquer modalidade, a que topa ir pra uma aula de qualquer coisa que seja. Veja bem: conheci meu atual namorado em uma aula de ACROBACIA. Com 31 anos, lá estava eu passando uma vergonha absurda na frente do rapaz que no caso era o professor tendo que colocar um colchão no chão para que eu tivesse coragem de dar uma… cambalhota. Bom, deu certo, estamos há 3 anos juntos. No caso das aulas, só fiz duas mesmo. E continuo péssima em cambalhotas.
O ponto é que só fui descobrir o prazer do exercício físico depois dos 30, justamente naquela idade em que nos dizem que não dá mais tempo de começar nada e que a gente morre de vergonha de ser iniciante em qualquer coisa.
Nunca tive coragem de entrar pro time de vôlei do colégio, era aterrorizante entrar numa quadra ao lado das “bichona” da escola. A turma da dança também era muito ocupada, se fechava no seu grupo de ensaios e eu ficava com vergonha de começar. E aí vieram os 20 poucos e o tempo era dedicado entre farra, faculdade, chegada ao mercado de trabalho e um casamento no meio do caminho. Atividade física ficou pra… agora.
Em mim, portanto, que deixei de fazer muita coisa por vergonha na tenra idade, o efeito veio o contrário: não tenho mais vergonha de nada, não preciso provar nada pra ninguém, ninguém paga minhas contas e não tô procurando ser aceita por aquele grupo (já tenho meus amigos), só quero mesmo mexer meu corpinho e me divertir em uma coisa nova. Quem tiver achando ruim, que vá tratar na própria análise.
Daí já foi de tudo: ballet clássico (o que mais me dediquei), jazz, arte marcial, acrobacia, jiu-jitsu (também fiquei um tempo legal), yoga, crossfit, natação no mar… o que me chamarem (ou eu sentir que tô afim), tô lá!
E nessa brincadeira descobri algumas coisas sobre ser adulto aprendendo uma atividade nova:
Você não é tão importante assim. Essa lógica adolescente de que o mundo gira ao redor do próprio umbigo já vai ter caído por terra e você perceberá que as pessoas não ligam muito pro que você sabe ou deixa de saber. Elas também tem mais o que fazer.
Tá todo mundo tentando. Isso quer dizer que mesmo alguém na primeira aula ou uma pessoa que já foi boa naquilo que tá retornando, no fim das contas, tá só todo mundo buscando ter um momento pra si.
Não ter obrigação de ser excelente é delicioso. Sem precisar provar nada pra ninguém e nem disputar atenção ou medalhas, no fim das contas cada atividade é só um prazer.
Todo mundo tem um trauma adolescente que não tá afim de reproduzir. Aquela risada pavorosa dos adolescentes se juntando pra rir de quem vacila (cena clássica de filme), ela não acontece em uma aula de adultos. É muito mais fruto de imaginação, referências cinematográficas ou traumas enraizados. Não vai rolar de novo.
Treinando, você consegue fazer coisas que jamais imaginou ser capaz. Eu abri espacate (sendo a pessoa mais encurtada que você já conheceu na vida), finalizei gente no tatame e nadei no mar. Insistindo um pouquinho, você se surpreende.
Professor gosta de ensinar quem tá afim de aprender, e não zé bichão que chega numa sala dizendo que já sabe fazer tudo. Tem nem graça.
Ficou um papo meio coach, né? Peço até perdão por isso. O lance é que o clima olímpico acende uma chama de se movimentar que é bom não ser perdida, ainda mais com todo o tempo enfurnados em casa e o quanto isso tá reverberando em nosso corpo e saúde mental.
Pois faz disso: aprende um negócio novo e ainda posta, que é pra se alguém achar ruim você ter oportunidade de praticar aquele esporte Olímpico mais antigo de toda a história da humanidade: mandar a pessoa a merda.
Meio Charlie Brown, meio Avril Lavigne
Foto: Gaspar Nóbrega/COB
Se o seu foco não foi bem o esporte, os uniformes das e dos atletas também são fonte de inspiração. Os bodys caprichados das ginastas, o estilo das tenistas e até figurinista premiado desenhando os uniformes (Tim Yip, que desenhou os uniformes chineses, foi indicado ao Oscar de figurino por "O Tigre e o Dragão") chamam a atenção de quem também gosta de moda.
Porém, o skate dominou mesmo nosso campo do desejo e, além da vontade de começar a praticar, também rolou um aumento pela vontade de se vestir como as campeãs. A Elle deu uma distrinchada nesse movimento!
Um tricô
Ninguém é mais forte que uma bailarina
A Ingrid Silva acaba de lançar a sua autobiografia: “A Sapatilha Que Mudou o Mundo”. A Ingrid é uma bailarina brasileira que mora nos Estados Unidos e brigou durante muitos anos para haver sapatilhas para bailarinas negras.
Durante 11 anos, Ingrid usou tinta em suas sapatilhas e um par, inclusive, está exposto no Museu Nacional de Arte Africana Smithsonian, nos Estados Unidos. Toda a trajetória dela está contada nesse livro que está em pré-venda. Eu quero!
Peraí, mas o que Luisa Sonza pode ter a ver com Clarice Lispector?
Eu não faço ideia de como cheguei aqui, mas precisava compartilhar com vocês essas referências do lyric video da Luisa Sonza com a icônica entrevista de Clarice Lispector ao programa Panorama, da TV Cultura. Entrevista esta, aliás, a última da escritora.
Pois bem, na música que faz referência à separação da cantora do Whindersson Nunes, a estética do vídeo e a encenação de Luisa conversam totalmente com as imagens de Clarice. O cigarro, a postura, a angústia, o tédio… Luisa trouxe tudo isso que Clarice demonstra na entrevista para o “não clipe” de “Penhasco”.
Se você nunca pensou que uniria, em uma mesma frase, Luisa Sonza e Clarice Lispector, agora já pode. E deve! Depois desse álbum virei Sonzer de carteirinha e amo Clarice desde a barriga da minha mãe (essa história deixo pra outro dia).
E o meu trecho favorito dessa entrevista:
Bons textos que li por aí (afinal, se você tá aqui, deve ser pq também gosta de ler uns textos por aí):
A xereca e os limites possíveis e os limites aceitáveis da originalidade numa transmissão -- A Milly Lacombe devia ganhar um prêmio só por esse título
Em meio às cinzas, a ideia de um Brasil que vale a pena - do Xico Sá, ainda no tema principal de hoje
A Flows também compartilhou suas tentativas esportivas de mulher adulta - e eu deixei pra abrir o e-mail dela só depois de escrever o meu quando vi que estávamos monotemáticas (e dá pra falar de outra coisa?) e não ser influenciada, mas agora estou deprimida pq ela escreve muito maravilhosamente incrível
“Todas as revoluções começam com a raiva de algo que é brutalmente injusto”, Isabel Allende para Marcella Franco na QuatroCincoUm.
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(ainda vale fazer referência ao vídeo da Pfizer?)
Quem leu a primeira newsletter já sabe que pedi demissão. Isso significa que estou “disponível para o mercado” e também investindo em projetos que nunca consegui dar vazão enquanto era uma jovem assalariada - como esse. O que eu tô querendo dizer com isso tudo? É que se você quiser colaborar com essa newsletterzinha que venho fazendo com amor e carinho, pode mandar um pix pra gabidourado@gmail.com (minha chave Santander)! Num vou achar ruim não
Té mais!