Sonhos anotados e um poema desmembrado
Li esses dias algo sobre a geração on line ser uma geração sem hobbies.
Sonhei com uma frase.
Corri pra anotar.
Esqueci.
Descobri que não lembro o sonho, mas escrevi um poema.
Sonhei que esqueci
Anotei para uma frase.
Corri.
Não sou de poemas. Deu para notar.
Esqueci como anotar.
Corri como uma frase.
Sonhei.
Poderia ficar o resto da vida brincando de misturar palavra.
Sonhei como quem corre.
Anotei pra não esquecer.
Fiz uma frase.
Sonhos anotados decifram palavras não ditas e desejos mal tratados.
Esqueci como que corre.
Sonhei em forma de frase.
Anotei.
Quis lembrar a frase escrita em sonho por que um dia me perguntaram o meu, e eu não soube dizer. Um sonho. Tenho não. Até tenho, mas não sei dizer. Nem qual é. Nem como faz.
Esqueci como que sonha.
Corri pra ter uma frase.
Não anotei.
Eu sei sonhar sonho de olho que fecha, não sonho de coisa escrita com data e dia pra acontecer. Eu sei sonhar sonho que não existe e nem concretiza porque deusmelivre concretizar um sonho. Vai que um dia abre o olho e tá lá o monstro apavorante, o carro desgovernado, a onda gigante, o nado no ar, a roupa que não entra, o grito que não sai, o tapa que não acerta, o correr lento, o nu em público, o sorriso sem dente, o texto esquecido, o voo perdido.
Sonhei que anotava.
Corri pra esquecer.
Não tem frase.
No sonho eu sabia que tinha uma coisa pra escrever. É que durante o dia eu lembrei que tinha uma coisa que eu queria dizer de um jeito, mas não anotei. Perdi. O sonho veio pra tentar me ajudar a lembrar. Mas eu esqueci. De novo. Eu sei que tinha a ver com sonhos.
A frase é pra sonhar.
Esqueci que era pra anotar.
Foi o jeito correr.
Fiquei com vergonha de não ter um sonho. Depois eu chamei pra dizer que ei eu tenho um sonho sim, viu, eu só não lembrei, mas eu tenho. Eu esqueci, mas é sonho mesmo assim. Talvez não tenha jeito de sonho, cara de sonho, corpo de sonho, cheiro de sonho, não se pareça em nada com sonho. Mas é um. E é o meu. Eu só não sei te dizer como ele é. É sonho sem forma, sem matéria, sem prazo.
Corri como uma frase.
Anotei sem esquecer.
Sonhi.
Sonho que realiza dá dois trabalhos. Ter que arranjar outro pra botar no lugar que vagou. Ter que lidar com a realidade que o sonho se tornou. Veja bem se vale a pena. Por isso vou chamar de sonho isso que eu nem sei se e o que é, só pra não ficar sem resposta. Acho que não quis responder que era pra depois não ter que dizer o que tô fazendo pra esse sonho existir. Cadê, num era teu sonho, tá fazendo o que por ele. Tô dormindo, ora mais.
Sonhei com um corre.
Anotei uma frase.
Esqueci.
Desisti de aprender a sonhar. E se me perguntarem de novo se tenho um, vou dizer que tenho, mas não conto pra ninguém.
Sonhei.
Corri.
Esqueci.
(Foi uma legenda de stories no instagram reescrita pelo amigo Hadji. Descobri ser um poema. Foi um encontro na livraria pra tentar materializar um desejo. A moça recém-apresentada a mim falou sobre “sonhos anotados”. E eu gostei dessa frase. Obrigada, Rosana e Hadji, pelo desbloqueio criativo)
Li esses dias algo sobre a geração on line ser uma geração sem hobbies. Tudo vira post, que vira conteúdo, que vira encomenda, que content, que vira branding, que vira start up, que vira negócio, que vira superação e sonho realizado. E aí ninguém faz nada só por fazer, só pra ser feliz, pra suar, pra parar de pensar, pra dançar, pra cansar. Tem que virar coisa pra vender, distribuir, planejar. E aí veja só, eu não sei pintar, nem cantar, nem bordar, nem desenhar, só sei escrever. E aí é escrever pra trabalhar, pra lucrar, pra pagar, pra emocionar, pra desaguar, pra divertir, pra relaxar, pra preocupar, pra sonhar. Haja dedo.
Alguém clica nesses links?
"Eu só consigo entender o que sinto depois de escrever". Quem diz é Erilene Firmino, jornalista cearense a lançar o primeiro livro: Manga Verde Com Sal. Os textos são cartas à irmã já falecida há 10 anos. O lançamento acontece dia 15, sábado, em Fortaleza, no Passeio Público, às 11h. Vai.
Eu dei uma entrevista e talvez você queira assistir. Foi aí que me perguntaram um sonho e eu não soube responder. Pode ser que você dê algumas risadas e fique querendo saber quem é a atriz antipática.
Delicinha esse papo com a Marisa Orth e a forma como a vida dela foi para caminhos completamente diferentes do esperado.
“existe vida profissional para além dos algoritmos". Pra gente lembrar.
A história mais engraçada que já ouvi nos últimos tempos é a da Heloisa Perisse no Porchat.
Tava com saudades dos teus textos por aqui ❤️
Fiz a "matrícula" aqui no site só pra te ler e BOOOM veja só! Lembrar e esquecer são pontas da mesma lança. Mas diz que quem lembra dos sonhos que teve dormindo, no futuro, terá mais chance de não esquecer do que viveu acordado. Não sei dizer porque, mas acredito. Obrigada pelos muitos links, pelo poema e pela fragmentação :)